sábado, 23 de fevereiro de 2008

"Os Caras" e o Fim da Tarde

Artigo 1.º

- Decreta-se por meio desta a extinção do entardecer.
O bucolismo cinza-depressão fica terminantemente impedido de se mostrar.
Acaba-se para todo o sempre o arrebol.
Não mais passáros se recolhendo em bandos pelos céus.
Não mais crias retornando às mães.
Não mais friagem a retirar casacos dos armários.
Não mais lembranças de abraços e aconchegos de amores passados.
O dia pode até mutar-se em noite,
apenas não pode haver esse interregno chamado "tarde".
Até mesmo o nome é indigesto.
Algo que já passou.
Já foi.
Tarde.
Proclame-se em todas as legislações
em todas as normas, decretos, leis, especificações,
bulas papais,
bulas de remédios,
propagandas de metrô.
Arautos sejam enviados aos quatro cantos.
Trovadores cantem aos quatro ventos (ou oito ou dezesseis).
Panfletos distribuídos em praças e ruas,
sermões e pregações em todas as igrejas.
Desta data em diante o poeta não sofrerá mais com esse período,
esse momento,
esses minutos em que lhe falta o ar de tanta tristeza observada.

Parágrafo único:
-Revogam-se as disposições em contrário
.

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